Já no ano passado ficamos impressionados pela qualidade da programação apresentada, tanto em Porto Covo como em Sines. O Festival continua com a sua política de atrair novos públicos, desde as gerações mais novas aos mais maduros conhecedores do jazz e da música clássica. É dessa fusão que surgem as músicas do mundo, termo popularizado por Peter Gabriel quando este assumiu editar e promover grupos e músicas fora daquilo que se convencionou chamar o mainstream das casas discográficas e das rádios.
Os organizadores do festival aderiram de plena consciência a esse conceito e os resultados fazem-se sentir com uma assistência heterogénea e internacional. Muitos espanhóis e italianos, alguns americanos e alemães. Ouvir músicos populares em países longe dos centros de decisão europeia ou americana não é fácil e requer escolhas estremadas. Entre a música erudita e a popular, estão os cantautores. Aqueles que pela qualidade aliam tradição e investigação a novas sonoridades mais contemporâneas.
Procurar essa diversidade e qualidade associadas não é uma tarefa simples para esta 20.ª edição. Passa por ver muitos festivais e ouvir imensas propostas: “Todos notamos o céu a cair-nos em cima com o peso da hipocrisia, da falsidade e de ameaças à nossa liberdade”. Assim inicia Carlos Seixas, director artístico e de produção, o texto no belo guia do festival.
Este ano as escolhas da produção foram direccionadas para a participação de 34 países e 43 concertos em 8 dias que em muitos casos totalizavam 12 horas de espectáculos contínuos. Um tour-de-force para nos preparar e encher as baterias para umas férias bem passadas. O espírito geral é descontraído, os portugueses em maior número e uma distribuição geracional desde as mais tenras idades até ao pessoal da bengala e da cadeira de rodas. Também algum campismo selvagem ajuda a contrabalançar as poucas economias de alguns. Fizemos este artigo de forma a poderem consultar os sites das próprias bandas onde poderão encontrar material por elas publicado.
Dia 20
Abrimos com o dia 20 de julho, sábado. O público enche a praça principal. Não menos de 3.000 pessoas estão presentes. As hostilidades ficam a cargo de um luso oriundo de Évora. 20 anos depois de lançar o seu primeiro disco volta agora com canções melódicas que têm por base o tradicional fado.
Duarte faz-se acompanhar por Pedro Amendoeira na guitarra portuguesa, João Filipe: viola e Carlos Menezes na viola baixo. O Alentejo abriu com chave de ouro. O artista apresenta uma carreira internacional com algum peso. https://duartefado.com
Samba Touré oriundo do Mali, um descendente da linha afro de Ali Farka Touré de quem recebeu uma guitarra de presente quando era pequeno. Hipnotizou completamente a plateia com a sua música. Três músicos, Touré na guitarra eléctrica e voz, Djimé Sissoko em ngoni e tamani e Souleymane Kane percussão com cabaça e djembé. Uma enorme cabaça que ele toca com os seus punhos e duas baquetes finas. São ritmos encadeados em síncopes dadas pelos instrumentos de cordas e a percussão de forma a atingirem o auge rapidamente. https://www.sambatoure.com
Livia Mattos voz e acordeão, Babu na tuba e Rafael na bateria.
Para acabar a noite Lívia Mattos do Brasil foi a completa surpresa. Entre alguns originais de Hermeto Pascoal e as suas canções de amor e ironia. Acompanham-na Jefferson Babu (de S. Paulo) na tuba e Rafael dos Santos (de Brasília) na bateria e pandeiro.
Lívia já tem três discos editados toca o acordeão de forma sublime. O seu ar pós-modernista é desconcertante, mas bem desenhado. Conseguiu empolgar a audiência e no fim prometeu uma passagem pelo público com ela e os músicos a tocar. https://liviamattos.com
Lívia deixou o público completamente rendido à sua performance, Rafael segue atrás com o pandeiro e Babu na tuba.
Foi o ponto alto da noite que assim poderia ter continuado não fosse já a hora tardia da uma da manhã.
Dia 21
No dia seguinte, íamos poder escolher entre as actividades paralelas oferecidas pelo Instituto da Praia, os animadores de rua, as inúmeras tendinhas de artesanato e bugigangas.
Da Colômbia, La Muchacha y el próprio Junte
Isabel Ramirez Ocampo com a sua voz potente mostrou que os cantautores de luta por causas como a liberdade, o feminismo e a paz não estão esquecidos e têm cada vez mais o seu espaço de denúncia contra a corrupção e os governos autoritários. Isabel acompanhou com vídeos de animações feitas por ela. Acompanhavam Miguel Velasquez Matijasevic no baixo, contrabaixo e Camilo Bartelsman na bateria.
A seguir SITI & THE BAND provenientes de Zanzibar, ilha pertencente à Tanzânia trouxeram consigo uma dose salutar de loucura. Siti Amina com a sua voz, dançou, tocou oud e percussão, tal como Neema Surrie no violino. Transmitiram muita energia com uma banda de excelentes músicos. Na bateria destacava-se Jimmy the Drummer e no baixo Sam Groove. Este conseguiu a rara proeza de entrar nas danças enquanto interagia. A entrada de Selah Khamis a tocar ganun, um género de harpa horizontal criou logo um ambiente de surpresa e tensão. Tudo calculado ao pormenor mesmo quando uma bailarina lindíssima entra e começa em despique. Razakey do lado esquerdo revezou-se entre o teclado e a percussão.
Para fechar LA CHIVA GANTIVA, da Colômbia e da Bélgica.
La Chiva teve a particularidade de aliar o canto de luta ao som mais rave. Os efeitos muito bem introduzidos com vocoders de voz com que Tuan Ho Duc no saxofone, loops e saxofone eléctrico e sintetizadores para a guitarra de Diego Higueiras. Rafael Espinel mostrou o quanto é importante ter uma boa voz fazendo-se acompanhar da guitarra e percussões. Este quinteto só ficaria completo com o “sandinista” Jose Buc no baixo e Daniel Millan na bateria. Atingiram vários picos de satisfação, especialmente entre o público feminino que aderiu completamente às propostas apresentadas. No fim, convidaram dois elementos dos Terracota para os acompanhar.
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Dia 22
Segunda feira veio com uma diminuição de público o que providenciou espaços menos densos e um público bastante atento. Os Três Tistres Tigres com Ana Deus na voz e Alexandre Soares na guitarra são os fundadores desta banda mítica do Porto. Acompanham o Miguel Ferreira nos teclados e programação, o Rui Martelo no baixo e o Fred Ferreira na percussão e samplers. Deixaram uma impressão profunda pelas canções e música na onda pós-urbana, um romântico meio depressivo com poesia e uma harpista convidada. Os vídeo cheios de cor e animação agradaram e deram o seu toque de requinte.
O personagem seguinte Melingo, um argentino tornado actor de cabaret, tanguista e demais provérbios que condigam colocou a assistência no seu rubicão de Canãa. Tal como as referidas bodas, Melindo presenteou-nos com uma ementa pantagruélica. Desde por todos a cantar, a rir e a chorar. Também se dançou e os sapatos voaram rumo à assistência que os devolveu com o merecido carinho. Uma figura incontentável da música argentina e porque não internacional.
Com Melingo e o seu clarinete vieram Romain Lécuyer no contrabaixo, Lalo Zanelli no piano de orquestra, Facundo Torres no Bandoneon (um acórdeão mais pequeno tocado sobre a perna e sentado) e o seu filho Félix na flauta de bisel e voz.
Os Dungen, suecos, eram os artistas seguintes, mas tiveram problemas com as ligações internacionais e as bagagens tendo sido substituídos por Expresso Transatlântico. Já estiveram presentes no ano anterior repetindo a sua actuação. Ver a crónica a esse respeito de há um ano.
Dia 23
Passámos de armas e bagagens para a bonita cidade de Sines (tirando tudo o que é a expansão industrial de grande escala. Também aí encontramos algumas pérolas). O porto antigo mantém a mesma traça e tudo se encontra bastante melhorado em relação a edições anteriores do festival.
SINES (CIDADE)
O Festival vai progredindo. Depois da adaptação ao choque inicial estamos preparados para a maratona que vai suceder quase ininterrupta entre o Pátio das Artes, o recinto do Castelo e a Av. Vasco da Gama. Isto para quem fazia directas às vezes cinco seguidas é apenas um reviver de emoções.
Estamos a 23 de julho numa terça-feira. Hoje ainda há alguma calma que logo no dia seguinte será quebrada. A ideia de dar espaço às escolas e aos seus projectos colhe pela importância que estas experiências têm na vida dos projectos.
ORQUESTRA LOCOMOTIVA + JONI SCHWALBACH + VASCO MARTINS (Portugal / Moçambique / Cabo Verde no Castelo
A Orquestra Locomotiva – Orquestra Sinfónica do Alentejo Litoral “reúne professores, alunos e ex-alunos de todas as extensões da Escola das Artes do Alentejo Litoral: Sines, Santiago do Cacém, Colos e Odemira. Depois de presenças anteriores no festival, esta formação dirigida por Marco Alves foi desafiada este ano para acompanhar e interpretar repertório de dois músicos convidados. Do músico moçambicano Joni Schwalbach, o concerto destacará não só as suas evocativas bandas sonoras para filmes, mas também a sua capacidade de fundir diferentes estilos em narrativas envolventes. Do músico cabo-verdiano Vasco Martins, será interpretado o 1.º movimento da Sinfonia n.º 3 ‘Arquipélago Magnético’, homenagem às ilhas de Cabo Verde, e “O momento presente”, concerto para piano e orquestra de cordas, clássico moderno em que tradição cabo-verdiana também está presente.”
Uma orquestra heterogénea que mudou de formação ao longo de algumas das composições apresentadas. Desde miúdos bastante novos a pessoas bem mais maduras. Irrepreensíveis acompanhados de vez em quando ao piano de cauda pelos próprios compositores.
Dia 24
JOSÉ MANUEL DAVID é o fundador dos Gaiteiros de Lisboa, um dos nomes referência da música popular portuguesa dos últimos 40 anos. Colaborou com os nomes mais sonantes da música portuguesa: Amélia Muge, José Mário Branco, Sérgio Godinho, entre outros. Acaba de lançar o seu primeiro disco a solo, Cantar a Eito. Vem acompanhado por músicos não menos brilhantes. Rui Vaz, voz, adufe e percussões, José Moz Carrapa nas violas, André Sousa Machado na bateria, Vasco Sousa no contrabaixo e Sofia David na voz. Um belíssimo trabalho que merece as melhores recomendações e elogios. “Ai se eu pudera” e os “Amores da Azeitona” têm uma sonoridade especial a apreciar.
Nguyén Anh Minh tem uma voz exótica ou não viesse da cidade de Ho Chi Minh, a antiga Saigão, situada no sul do país. Ali, ao virar da esquina, situa-se um bar onde estes músicos fazem reviver sonoridades entre o jazz, o rock, a electrónica e a música tradicional, proibidas logo a seguir à guerra, dos anos 60 e 70. Uma guerra que durou quase 20 anos e deixou marcas indeléveis com 3 milhões de vietnamitas mortos. Acompanham Indy Jeremy Vinh Laville na guitarra, Nguyễn Hương Bảo Hiếu na bateria, Gabriel Kaouros no baixo e percussões, Trần Nam Ky no teclado e Thị Hải Phượng com os instrumentos tradicionais (cítara e monocórdio).
FLORENCE ADOONI & BAND (Gana) @ Palco Galp – Av. Vasco da Gama
Os Florence provêm do Gana, têm o seu estilo próprio: o Frafra. É uma mistura das diferenças que existem entre o norte e o sul do país. As melodias sinuosas frafra do norte e os ritmos sincopados do highlife do sul. Florence Adooni na voz, Lovia Ayambire nos coros, Kofi Boakye no baixo, Drum Butique na bateria, Emmanuel Fosu no sax, Emmanuel Tetteh na guitarra, Emmanuel Opoku no trompete e Bright Osei no teclado completam a banda. Um rigoroso trabalho de coreografia que dá enfâse aos ritmos e melodias.
LA DELIO VALDEZ (Argentina) @ Palco Galp – Av. Vasco da Gama
Para o fecho da noite foi escolhida uma banda proveniente da Argentina. La Delio Valdez marcou pela qualidade estética e musical. 15 elementos em palco, entre 7 sopros, 2 congas, bongós e timbales. Nos trompetes: Pablo Vázquez Reyna e Agustín Zuanigh, nos trombones: Damián Chavarría e Milton Rodríguez, na guitarra Manuel Cibrian, no baixo Leon Podolsky, Sebastián Agüero nas congas e timbales, Tomás Arístide Güiro nas congas, Ximena Gallina Tambor Alegre na caixa, bongós e voz, Pablo Fidel Broide saxofone tenor e Santiago Moldovan no clarinete e no teclado. Pedro Rodríguez voz e timbales, Agustina Massara saxofone alto e Black Rodriguez na voz. Ivonne Guzmán brilhou com a sua voz forte e de timbre marcado. Os seus movimentos e o som do saxofone encantaram um público que respondeu à altura. São muitos, funcionam como uma cooperativa à imagem das antigas bandas do passado.
Dia 25
Acordamos ao som dos gritos das gaivotas. Parecem pedir mais do mesmo. Fazem bem. Logo de manhã ainda antes do meio dia. A noite prolongou-se para além das 4 da manhã. O dia irá ser preenchido com 9 bandas. Mais duas que as do dia anterior. A temperatura amainou um pouco, deu tréguas. Aqui fica o relato do dia 25.
CAAMAÑO & AMEIXEIRAS no Pátio das Artes.
Duas artistas oriundas da Galiza. Caamaño é professora de acordeão no Conservatório da Corunha e Ameixeiras toca o violino e canta. Juntas desenvolvem um trabalho que pretende aproveitar as raízes populares com as novas linguagens mais eruditas. Como dizem: Há poucas músicas a “falar do amor das amigas e dos amigos”. Presentearam-nos com belas cantigas e rituais da Galiza. Desde a dança daqueles se safam da morte e vão num caixão aberto suportado pelos amigos e pela família, às canções de engate.
Voltamos ao castelo para ver MOMO. do Brasil.
É um cantautor e a sua guitarra acústica. É uma pérola perdida no meio de tantas qualidades. A viver em Lisboa trouxe consigo um alinhamento muito interessante. Conseguiu encher o espaço do castelo numa hora ainda cedo. As suas composições são acompanhadas por uma voz forte e extremamente melódica. É daquelas pessoas que não precisam de muito para ficarem satisfeitas. Parte do zero para os 100% num arranque constante e perfeito. Uma preciosidade. Vem acompanhado de vários músicos relacionados com o seu sétimo e último disco. Os músicos que acompanam Momo são Julio de Castro no baixo, Rosie Turton no trombone, Tamar Osborn em saxofone e flauta e Ursula Milan na bateria e percussão.
iLe vem de Porto Rico. Logo o seu primeiro álbum iLevitable de 2016 recebeu um Grammy na categoria de melhor disco Rock Latino, Urbano ou Alternativo, em 2017. A partir daí o seu nível foi superando-se. Consegue aliar uma harmonia romântica cheia de contrapontos e ritmos a uma imagem simples e sinfónica multitimbral, com as linguagens mais contemporâneas com crítica social. A palavra de uma juventude que se expressa ao mais alto nível. Com iLe vieram Ismael Cancel na bateria, Enrique Bayóan Ríos na guitarra e Adalberto Rosario na guitarra. Uma das melhores prestações deste festival.
Entre a música hipnótica de origem poética, Byron e Pessoa, está um som urbano feito no campo. São uma orquestra paradigmática, anárquica na sua autogénese. As composições dos Tout Puissant são poderosas enquanto pensam e mostram um mundo que pode ser diferente. Temas como a solidariedade e a igualdade são importantes para as novas gerações que procuram afirmar-se na nossa sociedade. Lutam por isso. O som e as suas composições acompanham essas divagações. Entre o free jazz e o jazz free, muito zappiano. A orquestra é composta por: Dorian Selmi e Romane Chantre nas baterias, Vincent Bertholet no contrabaixo, Elena Beder e Aida Diop nas marimba, Titi e Romane Millet nas guitarras, Naomi Mabanda no violoncelo, Thomas Levier na viola, Mara Krastina na voz, Gif no trombone, Gilles Poizat na corneta, La Fraise no som ao vivo e Johan Caballé no som ao vivo.
Gyedu-Blay, músico renomado de craveira internacional dá o nome a uma banda proveniente do Gana e que tem marcado o panorama do Simigwa-Do lançado por ele. Tal como se revê como o primeiro a editar um disco de rap. Aqui as opiniões diferem bastante. Mas tudo indica que tem revolucionado gerações de músicos. O Simigwa.Do é uma mistura de highlife, funk, disco e rap.
Gyedu-Blay Ambolley no sax e voz, Justice Adjiri na percussão, Isaac Ansong no trompete, Joshua Nkansah na guitarra, Isaac Karikari no teclado, Peter Kadesh na bateria, Charles Donkor no baixo e Jonathan Bimpong no trombone.
PRÉTU – XEI DI KOR foi a primeira apresentação da noite no Palco da praia na Av. Vasco da Gama. A entrada do hip-hop da margem sul no festival de Sines. Prétu é cheio de cores, não é a ausência de cor mas sim a combinação de todas as cores. É um murro no estômago pela sua qualidade marcadamente anti-racista e anti-colonianista. Aliás, filho de emigrantes provenientes de Cabo-Verde que imigraram no anos 70. Pretu nasceu em Portugal. Pretu era o anterior Chullage, Xullaji é o outro alter ego por ele usado. Faz parte do colectivo Peles Negras Máscaras Negras, os quais fazem performances em diversos locais. Tem outros projectos como PREC: Poesia Revolucionária em Curso e a Luta Continua. Xullaji: voz, percussão, Raquel di Luz: voz, Alesa Herero: voz, Mick Trovoada: percussão, Henrique Silva: teclado, guitarra e baixo, Lucília Raimundo: bailarina, Cachupa Psicadélica (convidado): guitarra, voz
O Rei di Funaná como é considerado em Cabo Verde veio para arrasar e fechar a noite de quinta-feira com chave de ouro. São composições doces, inovadoras por não serem tão repetitivas rítmica e melodicamente. Uma dança que também se pode considerar hipnótica por quem se deixa levar pelos sons da gaita (concertina), guitarras, os batuques, as letras das canções e, finalmente, das danças difíceis de acompanhar num ritmo louco e imparável. Os coros ajudam a impor os refrões, e percebem-se. O fino humor e a crítica social.
Compõem a banda os seguintes elementos- Estevão Tavares (Iduino) – gaita (concertina) e voz, Carlos Lopes (Bino) – ferrinho e voz, Emanuel Tavares – congas, percussão e voz, Frutuoso Pina – percussão, caneca e voz, Luis da Veiga – bateria, Mário Mendonça – baixo, José Varela – trombone de vara, percussão e voz.
Dia 26
16h30: RED (França) @ Pátio das Artes
Muito na linha de Bob Dylan, antes de ser Red, Oliver Lambin, de Lille fez biscates, vendeu radiadores e foi funcionário funerário.
A imagem romântica do músico independente parece ter sido criada para descrever artistas como Red. Tudo nele é livre, autêntico, extensão da vida. Aprendeu a tocar guitarra sozinho a ouvir Dylan e Rolling Stones. Fascinado pelos cantautores anglo-saxónicos, foi também autodidata no inglês, a língua das suas canções. Red, a sua persona musical, nasce nos bares de Rennes em 1996. De então para cá, tem feito uma carreira de becos e labirintos, com mil projetos e parceiros. Não sabemos ao certo que Red vai estar neste concerto. E está bem assim.
Red: voz, guitarra elétrica
Os Cara de Espelho refletem aquilo que a sociedade é. Por assim dizer, são porta vozes de críticas à governação, à cobrança de impostos a pessoas de poucas posses entre outras contrariedades. Um alinhamento bem feito, forte componente rítmica e melódica. Um grupo surpresa que vem de armas e bagagens para ficar. A crítica social não só está na ordem do dia como é necessária para escape das nossas almas e consciências. Um projecto vindo da cidade de Lisboa. Músicos- Carlos Guerreiro: vários instrumentos, coros. Luís J. Martins: guitarras, coros. Maria Antónia Mendes: voz, Pedro da Silva Martins: guitarras, coros. Nuno Prata: baixo, coros. Sérgio Nascimento: bateria, coros. Gonçalo Marques: vários instrumentos, coros.
O álbum Mademoiselle foi publicado em Fevereiro de 2023.
“O músico Rachid Taha, que Sines recebeu duas vezes, deixou uma marca de indelével modernidade na música da sua Argélia natal, mas também na França onde se estabeleceu. É ainda o seu espírito rebelde que paira como um fantasma querido no projeto Mademoiselle, que junta o francês Rodolphe Burger (voz, guitarra) aos argelinos Sofiane Saidi (voz, teclados, baixo) e Mahdi Haddab (oud elétrico), todos eles com história no FMM. O álbum homónimo do trio, agora transposto para o palco, tem textos em francês e árabe e situa-se na intersecção entre o rock, o raï e os blues. Potente, mas também poético, um espetáculo para fazer a casbá, perdão, o Castelo abanar.” A belíssima voz de baixo de Burguer funde-se com os alaúdes de Haddab e os sintetizadores de Sofiane Saidi. São ritmos e melodias entre a electrónica, a música ritmada e o lounge. Acompanham: Rodolphe Burger: voz, guitarra. Sofiane Saidi: voz, teclado, máquinas, baixo. Mehdi Haddab: oud elétrico.
Nascida na Guiné-Bissau, vive em Cabo Verde de onde vem. É senhora de uma voz poderosa e as suas letras e músicas são populares. Traz temas do seu novo disco Praia Bissau. Além de compositora e autora das letras, é também pintora e activista. Deu seu nome para uma campanha recente pela promoção do amor próprio das mulheres chamada “Badjuda Bonita”. Senhora de uma grande voz com uma banda de suporte muito interessante composta por Fattú Djakité: voz principal, Jery Bidan: guitarra, Elias: baixo, Gilmar: teclados, Ndu: percussão e Magik: bateria.
Ahnansé é um artista com múltiplas atribuições, músico, líder, activista e colectivista, entre outras. Já esteve em 2022 no FMM Sines. Vive entre Londres e Bogotá. Uma musicalidade complexa mistura cumbia, hip-hop, electrónica, jazz, improvisação, loops e sampling com música latino-americana. Reflete sobre os problemas de uma juventude que vive em bairros periféricos e enfrentam problemas sociais graves como o desemprego, bairros degradados, drogas, falta de oportunidades dignas de vida, excesso populacional, etc. O seu álbum Mestizo é um trabalho profundo.
Ao FMMS24 trouxeram uma sonoridade próxima do jazz. Aliás, jazz latino americano. Um pouco longe das músicas publicadas na internet, mas com uma qualidade substancial.
Ahnansé: saxofones, Benjamin Appiah: bateria, Crispin Robinson: percussão, Lorenz Okello: teclados, Shantéh: voz, N. Hardem: voz, Daniel Michel: baixo, León Pardo: trompete, gaita, Nathaniel Cross: trombone.
GROUNDATION (EUA / Jamaica) @ Castelo
From and directly Jamaica! Os únicos, os maiores, os melhores reggae da actualidade. Rastafari vibration. 20 anos depois do lançamento do seu primeiro disco que se tornou numa revelação mundial, Hebron Gate (2003). A espiritualidade e o ritmo conveceram Harrison Stafford a fundar a banda quando andava na universidade de Sonoma na Caifórnia. Constituem a banda: Harrison Stafford: voz principal, guitarra. Zachary Morillo: bateria, Isaiah Palmer: baixo, Kerri-Ann Lewis: harmonias vocais, Thamar Williams: harmonias vocais, Darren Johnston: trompete, Paul Valls: teclado, Roger Cox: saxofone, Kris Dilbeck: guitarra principal, Jeff Cressman: trombone.
Para ver ANA FRANGO ELÉTRICO passamos para o palco Galp na praia. O que se pode esperar de uma artista com um nome parecido com este? Tudo. Claro.. Uma voz melodiosa, bonita, jovem, fresca, todas as características belas e as mais incomuns: punk brasileiro! Títulos como “Mulher Homem Bicho” e Me chama de gato que eu sou sua, o seu último disco lançado no ano passado.
Referência como pesquisa, mistura muito, redes sociais, tiktok, remixs, hits dos anos 50, a mistura do orgânico com o electrónico. A banda: Ana Frango Elétrico: voz, guitarra, Guilherme Lirio: guitarra, Pedro Fonte: bateria, Pedro Dantas: baixo.
KOMODRAG & THE MOUNODOR vêm de França.
Os anos de ouro do rock aí estão outra vez pela mão desta banda que não se limita a imitar, mas a reinventar completamente os riffs e sons desses anos entre 68 e 73. É como se voltássemos uns 50 anos atrás para ouvir os teclados e sintetizadores Hammond, Moog, as distorções e amplificadores a válvulas da época, os coros, as roupas, o cabelos, os movimentos, as letras, os temas, a iconografia, os instrumentos, acessórios, dois bateristas, os bigodes! Tudo se conjuga para nos transportar no tempo. E como funciona! Uma única diferença: usam wifi para não se enlearem nos cabos uns dos outros e na complexidade das instrumentações. A banda é composta por Goudzou: baixo, voz. Organ Fury: órgão, voz. Elrik Monroe: bateria, voz. Dr Mad Drum: bateria, voz. Ronnie Calva: guitarra. Melin Le Bigot: guitarra. Slyde Barnet: guitarra, voz.
SOFIANE SAIDI (Argélia) @ Palco Galp – Av. Vasco da Gama.
Às 5 da manhã, tivémos por fim o genial Sofiane Saidi e o seu Rai poderoso. É um dos elementos do projecto Mademoiselle, que hoje esteve no Castelo. Aqui surge num alinhamento algo diferente. A banda dele Raina Rai foi a primeira banda a tocar música rai ao vivo na Algéria. Baseado no Rai de origem argelina, ele é considerado o inventor do glam oriental. Nasceu na cidade de Sid bel Abbes. na Algéria. Chegou a Paris nos idos anos 90, onde se juntou a bandas de música afro-árabe Tukuleur, Transglobal Underground, Orchestre National de Barbes, Startijenn, entre outros. Em 2003, a sua voz chama a atenção da produtora e artista Natacha Atlas num festival em Espanha que o convidaria para vários projectos conjuntos.
Sofiane Saidi: voz, teclado, máquinas
ELIADES OCHOA traz-nos Cuba na sua alma e coração.
De Santiago de Cuba, Eliades Ochoa traz o seu “son” o qual rivaliza directamente com o da capital, Havana. Estrela no Buena Vista Social Club, proporcionou-lhe notariedade internacional. Com seis anos, inicia-se nas lides. As suas raízes musicais surgem na guajira. Entre os vários estilos que lhe moldam a imagem está o chapéu de vaqueiro e o instrumento tres cubano.
ADÉDÈJÌ vêm da Nigéria.
Grande espectáculo inspirado nas maiores produções internacionais. Músicos de alta craveira num estilo vulgarizado pelo afrobeat, uma mistura de funk e rock. O espectáculo baseou-se no álbum recentemente editado, Youruba Odyssey, o qual foi gravado em Lagos. Um olhar para as raízes iorubas, um dos principais grupos étnicos da África Ocidental.
Adédèjì: voz, guitarra. Samuel Olawale: teclado. Samuel Onwudo Obinna “Sammy”: bateria. Victor Ademofe: trompete. Raphael Lasisi: saxofone tenor. Wale Akindiya: guitarra baixo. Wura Samba: percussão. Ebun Arowosegbe: coros. Mary Sobowale: coros, violino.
SON ROMPE PERA é um grupo de cumbia psicadélica que vem do México. Foram a banda de fecho do festival no castelo de Sines. Empolgaram pela dupla de marimbeiros incendiada pela cumbia-punk dos irmãos Gama e sua banda. Com origem em Naucalpan, na periferia da Cidade do México, misturam vários estilos pós-rock modernos.
Mongo: marimba, voz, guitarra. Kacho: marimba, voz. Kilos: percussão, voz. Ritchie: bateria. Raul: baixo, voz.
AVALANCHE KAITO são uma colaboração entre a Bélgica e o Burkina Faso. Passámos para o Palco Galp na Av. Vasco da Gama.
Kaito é uma avalanche completa. Tanto pelo som da sua flauta como pela sua voz potente, rápida e cheia de inflexões. Apresenta-se na forma de trio e são uma mistura de punk com jazz e rock. A flauta de Kaito é feita de pvc e tem um bocal desenhado com uma saliência que faz em parte lembrar, pela forma de tocar, as flautas indianas e as do Chile. Mas não passam de flautas tradicionais do país, desconhecidas dos europeus. Os blogs da especialidade intitulam a sua música como Futurismo polirrítmico, epifanias cruas e parábolas burquinenses.
O seu último disco Talitakum é uma dose forte de tradições adicionadas ao rock e ao jazz punk.
Kaito Winse: voz, flautas, tama, berimbau de boca, Nico Gitto: guitarra, Benjamin Chaval: bateria, eletrónica.
MOTICOMA vêm de Moçambique com um som melódico que se aventura por áreas do lounge e “a percussão, sob várias formas, está no centro da sua paisagem sonora, colorida pelas vibrações delicadas da mbira, pela guitarra, pelo baixo e pelas melodias vocais.”
Mbira, também conhecida por kalimba, é tipo um berimbau de metal tocado com os dedos. É um projecto de revitalização de todos os ritmos de Moçambique, desde o rio Rovuma a norte, à capital, a sul.
Pak: percussão, coros, Mole: guitarra, percussão. ZANDY: mbira, percussão, voz principal. Cauas: saxofone, teclado. Dallas: bateria, coros. Jompepha: baixo, coros.
RIZAN SAID da Síria.
O fecho do festival ficou à responsabilidade de Rizan Said. Por todos os motivos e mais alguns, irá ficar na memória das pessoas durante bastante tempo. O título do disco The King of Keyboard (Rei do Teclado) chega para descrever o que vimos em Sines. O dabke, a dança da partilha e dos dias felizes nos países do Levante.
Longe da capital Damasco, o nordeste do país, conhecido como Jazeera, era rico em história e cultura. Graças a uma parceria com o produtor local Zuhir Maksi, este tipo de música, tocada especialmente em casamentos pode hoje em dia ser ouvida no exterior da Síria.
Rizan Said: teclados.
Sines acordava lentamente para a realidade. Foram oito dias onde se pôde ouvir música de alta qualidade. Uma selecção excelente de nomes, alguns completamente desconhecidos. Mais de uma vez se ouviu dizer o melhor festival do mundo. Pessoas de todas as proveniências encontram-se, fazem-se amizades que perduram. A organização esteve muito bem, tal como o som e a iluminação que têm melhorado consecutivamente.
A Exposição “Thalassa! Thalassa! – O Mar e o Mediterrâneo na obra de Sophia de Mello Breyner Andresen” mostra-nos através de uma selecção de obras de pintura e fotografia de artistas portugueses várias visões do mar.
O atelier Oficina “Gravura – Novos Suportes Alternativos”, por Ana Salomé Paiva esgotou, mas teve uma desistência a qual por ser em cima da hora me passou despercebida. A utilização de materiais alternativos no processo de gravura: tintas, superfícies, métodos de gravação mais amigos do ambiente.
Adeus gaivota, para o ano há mais.
Artigo publicado na Revista on-line InComunidade em 1 de Aosto de 2024